Meu novo livro: Novas abordagens

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sábado, 20 de julho de 2013

A culpa é da religião? - artigo - Jornal OPOVO


   A religião tem sido apontada como responsável pelo aparecimento do “sentimento de culpa” no sujeito, mas essa questão parece ser anterior aos rituais religiosos. A maioria das pessoas está “presa” ao passado, remoendo situações que não poderão mais ser modificadas e se sentindo “culpadas” por algum ato que em certo momento julgou ser “errado” ou “imoral”.
   A culpa, na maioria das vezes, não tem uma lógica, pois há queixas de sentimento de culpa que nada têm a ver com o sujeito. O historiador grego Heródoto (485-420 a.C) relata um ritual antiquíssimo de autoflagelo conhecido como “A festa de Ísis em Busíris”, em que grande número de pessoas se açoitava a si mesmo, como existe ainda hoje em alguns países esse ritual da lapidação ou do autoflagelo que, supostamente, libertaria as pessoas da culpa e do pecado.
   No ano de 590 d.C., o papa Gregório, o Grande, transformou oito tentações nos famosos sete pecados capitais, mas na verdade não são pecados, mas, sim, vícios e representados na figura alegórica do diabo, exemplo: avareza (Mammon); ira (Satã); inveja (Leviatã); gula (Belzebu); luxúria (Asmodeu); orgulho (Lúcifer); preguiça (Belfegor), pois a intenção da Igreja era tornar excessos em pecados, mas acabou enchendo a mente humana de sentimento de culpa.
   O psiquiatra suíço Eugen Bleur (1857-1939) forjou o termo esquizofrenia e nas suas pesquisas afirmou que o sentimento de culpa era anterior ao berço, sugerindo que a religião poderia somente aumentá-lo, já que não era a causa.
   Michel Foucault (1926-1984), no seu livro História da loucura, cita um caso clássico de um melancólico atormentado pelo sentimento de culpa e a encenação bíblica é recorrida para salvá-lo do seu sofrimento: “(...) Lusitanus narra assim a cura de um melancólico que acreditava danado, desde sua vida terrestre, por causa da enormidade dos pecados que tinha cometido. Na impossibilidade de convencê-lo através de argumentos razoáveis, segundo os quais ele poderia salvar-se, aceita seu delírio, e faz com que apareça um anjo vestido de branco, espada na mão, que, após severa exortação, anuncia-lhe que seus pecados foram redimidos”.
   A questão da culpa foi inserida na cultura por motivos desconhecidos, mas é apenas uma questão cultural, pois, em alguns casos, o que pode ser considerado repreensivo e imoral numa, noutra pode não ser. Não encontrei, até o presente momento, qualquer utilidade para o sentimento de culpa, pois a sua existência é desnecessária, evitável e curável...

 

Luís Olímpio Ferraz Melo é psicanalista e autor do livro Psicanálise para todos.



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